"Natal
Madeiro / Missa do Galo / Filhós
Noite, geralmente fria, árvores descarnadas a erguerem os braços para o céu, campos desertos, caminhos sem viandantes (a não ser os que à última hora recolhem a pátrios lares), a véspera de Natal tem não sei quê de unção, de poesia, que a todos, cristãos, ou livres-pensadores, crentes ou ateus, faz reunir, vindo das maiores distâncias, no conchego e convívio santo da família.
E o nosso povo, fiel de velhas e lindas tradições, vai hoje, para honra e louvor do Menino Jesus, e para que os pobrezinhos tenham onde se aquecer, colocar no adro da Igreja grandes troncos de árvores que arderão, e morrerão em vivo braseiro, durante todo o ciclo do Natal.
Em Castelo Branco, como em grande número de povoações da Beira Baixa, são os rapazes que, aproveitando o primeiro carro de bois ou carroça de muares que se lhes depara na via pública, fazem o transporte dos madeiros.
Em Idanha-a-Nova, são as mordomias de São João, do Espírito Santo, etc. constituídas por gente moça, que enfeitando os carros e os bois com grandes fitas multicolores, entre vivas aos santos da sua devoção, e acompanhados de uma grande caldeira de cobre ou de uma cântara cheia de vinho de onde todos bebem por um copo de lata ou de esmalte com asa, vão carregar grandes troncos de velhas árvores que hão-de arder no adro da igreja ou junto das capelas daqueles santos.
Em Castelo Branco e em Idanha-a-Nova, como em todas as localidades que pertencem ao bispado de Portalegre, durante toda a noite de Natal, especialmente à entrada e à saída da missa da meia noite, "missa do galo", não cessa a romaria ou visita ao madeiro, sucedendo-se , uns aos outros, alegres grupos a entoar, com a canção que segue (1), hossanas ao Salvador:
Ó meu Menino Jesus!
Ó meu Menino tão belo!
Logo viestes nascer
Na noite do caramelo.
Ó meu Menino Jesus!
Convosco é que eu 'stou bem,
Nada deste mundo quero,
Nada me parece bem.
Entrai, pastores, entrai,
Por esse portal sagrado,
Vinde a adorar o Menino
Numas palhinhas deitado.
Entrai, pastores, entrai
Por esses portais adentro,
Vinde adorar o Menino.
No santo Nascimento.
Alegram-se os céus e a terra,
Cantemos com alegria,
Que já nasceu o Menino
Filho da Virgem Maria.
Todos os filhos dos ricos
Dormem em lençóis doirados (em leito dourado)
Só vós, meu Menino Jesus,
Numas palhinhas deitado.
Todos os filhos dos ricos
Têm belos travesseiros,
Só vós, meu Menino Jesus,
Preso a esse madeiro.
De quem são as camisinhas
Que a Senhora está a lavar?
São do Menino Jesus
Qu'inda está por baptizar.
Respeitando a tradição, muito pobrezinha há-de ser a casa que, na noite de Natal, não tenha na lareira abundante braseiro, e não faça filhós, bolos muito espalmados de massa de farinha e ovos fritos em azeite.
(1) Segundo o Dr. J. Leite de Vasconcellos estes cantos devem pertencer a um antigo auto do Natal."
Tradições e Costumes da Beira, recolhas de Jaime Lopes Dias, pág.115 a 117
Alma Azul
http://pt.wikipedia.org/wiki/Madeiros